18 de mai. de 2011

Apego ou Apelo

(uma crônica autobiográfica)

Quando pequeno, ainda lembro, quando brincava com "meus" súper heróis da Marvel - que não eram meus e sim de um amigaço de infância, meu vizinho mais próximo. Ele tinha os bonecos de plástico, quase todos da série, mas com um detalhe: estavam quase todos estragados. Um faltando uma perna, outro sem um braço e, um deles, o que é pior: não tinha a sua arma, o seu súper poder. Brincávamos sem parar. Às vezes na casa dele, às vezes na minha.Eu carregava certa frustração por não possuir nenhum desses brinquedos, mas me satisfazia plenamente com aqueles bonecos mutilados.
A minha ficha caiu há pouco tempo: depois de 40 anos eu me dei conta dos valores que foram dados para cada situação ou sentimento da minha vida.
Numa certa rara manhã, meu pai passou pelo pátio de casa e me viu brincando com aqueles bonequinhos quebrados com os quais, feliz da vida, eu me distraia. Perguntou se aqueles bonecos eram meus e se eu não ficava aborrecido de brincar com eles naquele estado.
Primeiro fiquei espantado de ver meu pai se interessando por mim e meus brinquedos e, segundo: aonde ele queria chegar com essas perguntas?
Bem eu respondi que nenhum daqueles bonecos era meu e que não me importava de eles estarem quebrados. Meu pai imediatamente perguntou se não era melhor trocar todos aqueles bonecos com defeito por “um” novo em folha. Eu lhe disse que poderia aceitar um novo, mas também gostaria de continuar brincando com os velhos e emprestados bonecos.
Ele disse: "Vamos agora mesmo comprar um novo súper herói! E eu gritei: "Só se for agora!"
Fomos nas Americanas, que naquele tempo não tinha nem escada rolante. Chegamos à seção de brinquedos e logo localizei os súper bonecos. Meu pai perguntou qual deles era o mais legal pra mim. Eu fiquei em dúvida, pois havia todos os súper heróis da série nas prateleiras; ele apontava, sugerindo: "Esse aqui, tá bom?", "Que tal esse outro..?", " E este daqui então?"... Eu dizia: "Calma pai, não era só um, conforme me disseste lá em casa?" Ele: "Um só é pouco. Vamos levar todos da série. Todos novos e sem nenhum defeito... fiquei chocado de te ver brincando com aqueles bonecos mutilados e resolvi renovar seus brinquedos".
Naquela época, minha cabecinha de cinco anos deu um nó, e hoje, na minha de 46, esse nó começou a se desfazer. Percebi que minha escala de valores e apegos teria que ser renovada, ou melhor, reciclada.
Ao mesmo tempo em que ficava feliz por possuir, não simplesmente um boneco só meu mas, todos da série - e novinhos! -, eu ficava um pouco triste por ter de descartar e devolver todos aqueles bonecos estragados.
Eu tinha simplesmente ignorado a famosa tabela de valores e apegos pessoais. Simplesmente usei e usufruí a lei natural da natureza. Isso mesmo, a lei “natural” da “natureza”, que temos de sobra dentro de nós. Pena que não ousamos ou usamos muito pouco dela.
Meu pai, com um gesto de pura emoção, comovido, talvez tenha se visto na minha situação e remeteu a sua infância.
Valeu, pai! Um simples gesto de atenção, como comprar brinquedos para um de seus quatro filhos, trouxe hoje, para mim, uma enorme contribuição para a evolução de minha escala de apegos e de minha alma.
Leia a parte [ 2 ]

Um comentário:

  1. apego ou apelo...bonito texto...meu amigo,o importante de tudo isto é q sabes dar valor ao q realmente importa nesta vida e q $$ algum compra...abração e sucesso!

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